28 de outubro de 2011

Dentro de ti a encontrarás


Rasguei a folha do meu diário, não obstante, considerei infrutífera esta tentativa de arriscar aniquilando o forasteiro sentimento que me sorveu.
Paginei todos os recantos de mim e só me defrontei com dúvidas e questões.
Prossegui, com a expectativa de encontrar novas atitudes, perante a imponente presença dos pontos de interrogação que atropelavam cada resposta que ousava disputar, criando uma tal algazarra que não abalroei outra alternativa senão a de me render.
Borbulhava em mim a vontade extrema de aquietar minha mente renhindo as respostas imediatas a todos os porquês que encontrei no meu caminho. Mas felizmente se fez luz no momento certo e incumbi-me de cuidar desta ansiedade dando tempo ao tempo.
O grande giz da ardósia que apenas arrola respostas está delicadamente velado no mais profundo de mim e me permite nomear de focar.
Indaguei na maior percepção que podemos ter, que é eternizando-nos como seres completos e usando todos os sentidos que dispomos, que as respostas virão no tempo certo.
Não é no exterior, mas dentro de nós que decorre o maior mistério da vida. Que nos leva a caminhos de duvidas ou de certezas. Que nos transporta para o conforto ou para o sofrimento, de acordo com o processo que precisamos viver naquele exacto momento.
E agora, ainda tens dúvidas?
Ainda queres procurar o maior mestre que te redunde gratuitamente as soluções, ou já consegues repassar o impenetrável do teu ser e recitar as mais requintadas respostas que aformoseia cada linha e entrelinha do diário da tua vida?
Ciente que independentemente de te poderem alumiar à alegria imediata ou à tristeza profunda, nasceram integralmente a fim de desaguarem na ascensão de um ser que se lapida dia a dia.

24 de outubro de 2011

... e eu?


O abraço que chega na hora em que a medula já congelava da falta de afecto.
A palavra amorosa que toca ainda quente o ouvido, no momento de desespero em que o turbilhão de problemas lhe fazia sentir que nada valia a pena.
A presença notória que abraça sem gesto e aquece sem toque, que anula a expressão de expectativa, resultando a tristeza de um olhar que já não se esconde mais.
O telefone esgotado da antiguidade, toca em surdina, rompendo o silencio já carregado da poeira da solidão.
A velhinha senhora, vincada pelas irregulares rugas, suplica o afecto dos filhos e netos que a olham como um estorvo esgotante de instantes de lazer.
O doente fita ininterruptamente a porta aguardando micas visitas, solicitando já desesperado, afago às gotas de chuva que escorrem pela janela.
Desaperto os fios dos sapatos, com desconsolados pensamentos que me abotoam e me trazem à triste realidade. Recolho-me incrédula nesta amálgama de sentimentos, a destilada impotência de males que não consigo resolver e de desgostos que não se descortinam cessados.
O ombro amigo abortado de impossibilidades de cooperação, curva carregado dos seus fantasmagóricos enigmas sem alcançar soluções.
O fardo de consecutivas inquietações que se acumulam dia após dia e penetram o silencioso grito do apoio que não acerca.
Preocupações de ser, apoiar, e oferecer espontaneamente a palavra amiga que anseia ouvir. O querer ansiosamente receber o troféu da bondade, gratidão e da caridade fazem-me ecoar, e eu?
Quem se diz disponível para me ouvir, para me ajudar, para me dizer, estou aqui?
Amargos murmurinhos de vozes que se sobrepõem e repisam silêncios de palavras que não chegam mais ao meu coração. Da ajuda que suplico e do ombro amigo que perdeu o vigor para apoiar o meu mundo de problemas.
Amigos sim, mas ausentes das dificuldades que os cerca  em elevado grau e os preenche de contados segundos que os seus relógios já não disponibilizam mais para quem  manifestam conceber uma amizade sem fim.
Obrigado a todos os que se afastaram e não mais tiveram tempo de ouvir as minhas lamechas. Permitiram brotar dentro de mim todo o apoio e amor que procurava em cada ser que ascendi ao estatuto de amigo.  
Assenti descer ao meu mundo de momentos aflitivos, dor e angústia, compartilhando com todos os eu’s que avançam comigo na estrada da vida, e apregoar até ser ouvido no mais obstruso de mim: Tens inexplicavelmente dentro de ti tudo para te abraçares infinitamente com o maior estado de felicidade: A paz, o amor e a bondade!

13 de outubro de 2011

Traçando Vidas


Serpenteia uma rua repleta de gente, os ritmos, esses são extraordinariamente diferentes.
Interesso-me pela análise minuciosa de cada um. Individual sim, porque cada pessoa deve se reger por ela a e ela mesma.
Infelizmente sei que isso nem sempre acontece, as influencias nas personalidades mais frágeis, nas pessoas inconstantes, levianamente alteram comportamentos com a facilidade de um bocejo.
Continuo inerte na minha torre de controle a dissecar simplesmente. Meus olhos pintam de brandas cores a realidade enquanto os sons entram nos meus ouvidos como um sussurro. Ambos deixam-me focar em paz não criando o mínimo deslize à minha vigilância.
Aéreas pessoas deslocam-se a passos tão rápidos que dão a entender que o mundo vai acabar logo a seguir ao almoço e apenas dá tempo para deglutir o ultimo café.
Outras, por sua vez, movimentam-se tão tranquilamente, como se fossem os clientes numero um do espaço Zen mais famoso de Lisboa. A sua tranquilidade faz reflectir. Afinal esse deveria ser o passo adoptado por todas, mas o burburinho interior assim não o permite.
Os rostos, lindos e fantásticos, cada vez mais polidos e retocados, fazem acreditar que estamos perante o maior evento de moda de Paris. Deixando escapar olhares foscos despojando com eles tristezas e insatisfações.
Velhos, transparentes na miragem de muitos, também lá estão. Uns sentados no banco do jardim à espera que mais um dia das suas vidas passe rapidamente, para que as dores físicas e as dores da solidão não os consumam por dentro, como aquele copo de água que num momento de desesperada sede se engole instantaneamente.
Outros, vencedores, arrastam dolorosamente suas já estafadas pernas, apoiadas muitas vezes pela imprescindível bengala, na tentativa de reduzir o esforço de carregar os anos, os problemas e as angústias, fazendo-se notar pela forte capacidade de luta e garra. Transmitindo o quanto a vida é válida até que algo superior detenha a sua continuidade, porque enquanto a máquina cerebral assim o permita, será sempre possível encarcerar o comando de um móvel corpo físico.
Há ainda quem observe e goste de ser notado, fazendo sentir a quem por eles passa que são pessoas, com sentimentos e quereres, outros, não sei se vivem dentro da cápsula de abrigo, ou se sentem num intocável trono, prognosticam a quem esbarram, com esforço aparente, que a dimensão do seu ego é tal, aparentando querer a humilhação do próximo, forçando-os a sentirem-se objectos vazios de conteúdo, desnecessários à suas ricas vidas, recheadas do gracioso e do belo.
Somos o vento que passa aos seus olhos, não tendo a possibilidade de alterar nenhuma das paisagens que estranhos olhares vislumbram. De uma mera ilusão assim vivem, porque a vida, essa maravilhosa faculdade de conhecimentos, encarregar-se-á de lhes dar o imprescindível diploma da humildade.
Prossigo, na real viagem pela sociedade de culturas, gostos e personalidades diferentes, olhares lanço, gestos decifro, uns resplandecentes, outros enigmáticos, mas cada um me instrui. Albergo tranquila aos meus aposentos, ciente que todos têm uma missão nesta vida, Compete a cada um entender qual é a sua, e a nós, resta-nos a argúcia de seguir a nossa com mestria.

6 de outubro de 2011

Uma janela para o mundo, uma porta para a solidão


Como tantas noites, o sono se infiltrou nos lençóis macios, mas a alma ao invés do descanso na fofa almofada, caiu nas redes do infinito túnel da realidade brutal que a contaminou.
Uma solidão bordada pela transparência da companhia que se fez invisível.
A radical transformação do planeta, marcado pelas fissuras que tomaram conta da sua forma, deixaram por elas entrar um vírus, contaminando silenciosamente toda a sociedade.
Dando lugar a uma nova vida que deixou de se cobrir com as vestes da sabedoria e do encantamento, de saborear cada estrela oferecida pelo céu gratuitamente, da pintura que o pôr-do-sol regala ao olhar, e se preenche de desbotadas luzes disfarçadas de palavras, imagens e sons de horas esquecidas por trás de um impessoal monitor.
Contaminou-nos a novidade da Internet que se aproximou a passos largos, exibindo o outro lado de uma vida fácil mas totalmente descartável e assassina.
A cada dia deixamo-nos perder nas teias de algo que discretamente abre a porta para o conhecimento. Passamos a deter a ilusória sabedoria, fazendo-nos sentir os mestres desta desapiedada informação.
Um novo conceito de família se vive, o Todo é substituído pelo individualismo e pela independência. As partilhas, a união e as conversas vão-se dissolvendo e doentiamente transformadas em orvalhos de solidão.
Encontramos nela, a janela aberta para encontros e desencontros que se desenlaçam com a destreza de um piscar de olhos. As conquistas fáceis pagam-se pelo desmoronar dos amores mais profundos.
Os amigos reais ressaltam na distância do tempo perdido atrás desta luminosa janela, transformando-se em virtuais, falsificando a vontade do aconchego físico. Em momentos complicados onde o apoio se torna o balão de oxigénio para erguer vidas que rastejam e suplicam por um ombro amigo, que buscam ferozmente a palavra de apoio, findam com o silêncio a ecoar mais alto.
Criam-se à pressão amigos virtuais, abraçados pelas supérfluas partilhas repletas de novidade, alegria e prazer, onde os problemas são meramente utopia.
O saldo analisado com a minúcia necessária, leva à triste conclusão que está muito além do negativo. O lado bom, não compensa os dissabores que ela arrasta.
De que vale a sabedora se no dia-a-dia não se aplica, se o verdadeiro valor vai-se perdendo, famílias se desfazem, amigos se perdem, se momentos de lazer são sugados ….
Há que segurar nas rédeas das nossas vidas enquanto é tempo, filtrar com o rigor e a urgência necessária. Viver com a real consciência que o que é verdadeiramente valioso, quando perdido, por vezes não volta mais.
Simplesmente porque neste moderno mundo de ilusão tudo se dissipa drasticamente.